Queda do PIB industrial é reflexo da alta taxa de juros e de condições financeiras restritivas
- Atualizado emAgência Indusnet Fiesp
O PIB brasileiro cresceu 1,9% no 1º trimestre de 2023 em relação ao 4º trimestre de 2022, após cair 0,1% no trimestre anterior, considerando dados com ajuste sazonal. Este resultado veio acima da projeção da Fiesp e do Ciesp (+1,3%) e da expectativa do mercado (+1,2%) e foi influenciado pelo expressivo desempenho do setor agropecuário e pela resiliência de serviços. Com este crescimento no 1º trimestre do ano, o carregamento estatístico [1] para 2023 é de 2,4%.
Pela ótica da oferta, o principal destaque foi a agropecuária, que exibiu aumento de 21,6% sobre o 4º trimestre de 2022. O setor de serviços também apresentou crescimento, de 0,6%, com destaque para transporte (+1,2%) e atividades financeiras (+1,2%). A indústria geral, por sua vez, registrou queda de 0,1% no trimestre, com desempenho heterogêneo entre os subsetores. Enquanto indústria extrativa mineral e o setor de eletricidade, gás, água e esgoto cresceram 2,3% e 1,7% no 1º trimestre, respectivamente, os segmentos de construção civil e indústria de transformação caíram 0,8% e 0,6%, nesta ordem.
No que se refere à ótica da demanda, as exportações diminuíram 0,4% no trimestre, enquanto as importações caíram 7,1% no mesmo período. Além disso, o consumo das famílias e o consumo do governo cresceram 0,2% e 0,3% na passagem trimestral, respectivamente. Por fim, a formação bruta de capital fixo recuou 3,4% no 1º trimestre de 2023. Todos os dados acima contemplam ajuste sazonal e são detalhados na Tabela 1.
[1] O carregamento estatístico diz respeito à herança estatística de uma série. Isso significa que mesmo que o PIB brasileiro fique estável ao longo dos três próximos trimestres de 2023, ainda deverá crescer 2,4% no ano.
Tabela 1 – Variações trimestrais do PIB (em %)
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados do IBGE.
Influência positiva do agro e resiliência do setor de serviços
O crescimento mais forte e acima das expectativas no 1º trimestre foi influenciado pelo resultado expressivo do setor agropecuário. Este desempenho está relacionado à safra recorde de grãos em 2023, que normalmente se concentra no início do ano. Como apresentado no Gráfico 2 e 3, há expectativa de aumento de quase 14% na produção de grãos em 2023 ante 2022, com destaque para o crescimento da produção de soja (+23,2%) e de milho (+8,7%).
Cabe destacar que a despeito da agropecuária corresponder a apenas 8% do PIB, o setor possui efeitos indiretos sobre os demais setores, de modo que podem ter ocorrido externalidades positivas da supersafra ao longo da cadeia produtiva.
Gráficos 2 e 3 – Produção de grãos em 2023
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados do IBGE.
Além da influência positiva no setor agropecuário, há destaque também para a resiliência do setor de serviços e, em menor grau, do varejo. A continuidade do dinamismo de serviços está relacionada principalmente à expansão da massa salarial (Gráfico 4), amplificada pelas medidas de desoneração e de transferência de renda do Governo Federal, fatores que têm contribuído para a sustentação do consumo.
Gráfico 4 – Expansão da massa salarial ampliada
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados do IBGE.
Impactos da política monetária restritiva no PIB da indústria
Já a produção industrial continua 1,3% defasada em relação ao nível pré-pandemia e segue apresentando fraco dinamismo. Neste cenário, o PIB da indústria de transformação apresentou a terceira queda consecutiva e a sétima redução nos últimos dez trimestres. Este desempenho tem sido fortemente influenciado pelo elevado patamar da taxa de juros básica e pela permanência das condições financeiras restritivas, que afetam de maneira ainda mais intensa a indústria.
Conforme aponta o Índice de Condições Financeiras (ICF-FIESP) [2], as condições financeiras da economia brasileira continuam em terreno restritivo, sobretudo devido à manutenção dos juros internacionais e doméstico em patamar elevado, o que tem impactado negativamente as condições de crédito. Este alto patamar das taxas de juros nas economias desenvolvidas, somado à desaceleração da atividade global, tendem a atuar como freios para a atividade nos próximos trimestres (Gráfico 5).
Gráfico 5 – Indicador de Condições Financeiras da Fiesp (ICF-Fiesp)
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados do BCB e da Bloomberg.
Projeções da Fiesp para o PIB em 2023
Diante deste cenário e da expectativa de que a redução dos juros básicos terá início apenas a partir do segundo semestre, a Fiesp projeta um novo recuo para o PIB da indústria de transformação em 2023, desta vez de 0,4%. Se confirmado, este resultado configuraria a sétima queda em 10 anos.
Portanto, caso seja verificado, o desempenho positivo da economia brasileira em 2023 estará condicionado principalmente ao resultado do 1º trimestre, em virtude do desempenho muito favorável do setor agropecuário e da resiliência do setor de serviços neste início de ano. Neste cenário, a Fiesp espera crescimento de 2,6% do PIB em 2023. O setor industrial, por sua vez, deverá continuar enfrentando dificuldades para sua retomada sustentada, sobretudo em razão da manutenção da taxa de juros em patamar elevado por um longo período em um contexto de dificuldade para obtenção de crédito, em conjunto ao cenário de desaceleração global, reforçado pelo aumento das taxas de juros em economias desenvolvidas, como os Estados Unidos e a Zona do Euro.
Nos próximos trimestres, a economia brasileira deverá perder fôlego, de modo que o PIB deverá crescer apenas 0,5% no 2º trimestre, segundo projeções da Fiesp. Por outro lado, medidas de estímulo fiscal e a aprovação do “regime fiscal sustentável” podem contrabalancear essas forças contracionistas, colaborando para uma trajetória de maior dinamismo da atividade econômica no restante do ano. No horizonte de médio/longo prazo, a Reforma Tributária também poderá ter significativo impacto sobre a competitividade industrial e o crescimento econômico, sendo elemento essencial para o esforço de reindustrialização do país.
[2] O indicador, que resume o comportamento das principais variáveis que influenciam as condições financeiras e antecipa os ciclos da atividade doméstica entre 3 e 6 meses.