Artigo = O Brasil real e aquele no qual acreditamos - Diadema

Artigo = O Brasil real e aquele no qual acreditamos

 

Artigo = O Brasil real e aquele no qual acreditamos:

Por: Donizete Duarte da Silva, sócio titular da CSI Controles e Sistemas Industriais, diretor titular do CIESP Diadema e diretor do DEMPI – Departamento da Micro, Pequena e Média Indústria da FIESP

 Interessantes são os caminhos que a humanidade percorre no sentido de sua própria evolução. Ao trilhá-los, nos organizamos, delegamos poder a nossos iguais em busca da ordem, já que na maior parte das ocasiões os caminhos são espinhosos. Séculos foram gastos buscando tal organização, muito sangue inocente foi derramado no processo, mas, caindo e nos levantando, cremos que, apesar da dor, o caminho nos vale a pena.

Vivemos no Brasil, aqui criamos nossos filhos e tornamo-nos empresários, e é daí que surge nossa necessidade de nos manifestar. Como empresários que somos, arriscamos nossos patrimônios na busca por nossos sonhos, criamos empresas e empregamos trabalhadores, não abdicando das responsabilidades que temos com suas famílias.

Fruto de movimentos históricos que não soubemos avaliar, nos entristecemos hoje ao observar o lugar para onde estamos sendo conduzidos. Vivenciamos um cenário que depõe contra a nossa capacidade de empreender e, consequentemente, contra nossa capacidade de honrar os compromissos que assumimos com todas as famílias ao nosso derredor.

Em nossa sociedade, constatamos hoje o agigantamento da distorção do conceito de empreendedorismo, que deixou de ser a ação maior de quem acredita em sua nação, que procura nela gerar riquezas que beneficiem a todos antes de beneficiarem a si mesmo, e passou a ser considerado uma ameaça ao Estado utópico que visa à liberdade plena pela eliminação de toda ela.

As ações que nos conduziram a este momento iniciaram-se há décadas, e têm sido suficientemente diminutas ao ponto de não serem percebidas. Acreditamos viver em determinada nação quando, na verdade, ela constitui-se em outra. Ingenuamente imaginamos viver onde o protagonismo reside no cidadão, em particular no empreendedor, quando em verdade o Estado é quem assumiu tal papel.

Industriais que somos, temos dificuldades imensas em discutir com as nossas autoridades toda e qualquer medida que melhore o ambiente dos negócios por nós conduzidos. Formalmente, podemos citar como zonas de conflito: a legislação tributária, a legislação trabalhista, a legislação ambiental, a fiscalização em todas as suas esferas, os conflitos tributários, as taxas de juros, a burocracia, o relacionamento com trabalhadores (cooptados por sindicatos que nos demonizam para se autoafirmarem, como se o empreendedor fosse um alienígena usurpador) e os bancos escolares, onde a livre iniciativa é abominada e a ideologia substitui o livre pensar.

Nossas ações pecam pela ausência de um norte claro, que indique para a sociedade a razão de nossos pensamentos e os valores em que se baseiam, os quais não são estranhos ao nosso povo, em particular aos menos favorecidos. Precisamos tornar claro que nosso universo não se circunscreve aos nossos umbigos.

 Numa indústria somente existem capital e pessoas. Os produtos e serviços que oferecemos são resultado da ação desses dois agentes, a eficiência na produção ou oferta decorre da qualidade da gestão desses dois insumos, a eficácia dos produtos e serviços deriva da qualidade e aderência do material humano empregado, além da disponibilidade de capital para financiar a atividade. Os resultados que obtemos podem ser medidos pelo orgulho e reconhecimento de suas famílias, pelo crescimento do capital internado, pelo grau de cidadania observado na sociedade e pela consequente realização pessoal. Geramos, assim, cidadãos livres, cônscios de seus deveres, tolerantes, críticos, responsáveis e orgulhosos de seus feitos, brilhantemente caracterizados pela pirâmide de Maslow.

O exercício de liderança industrial precisa levar em conta tais princípios e constatações. Precisamos trazer definitivamente para o nosso derredor as pessoas de bem que habitam nossas cidades, a começar pelas que dependem de nossas indústrias, e, para tanto, precisamos desenvolver ações simples, iniciando por alterar nossos discursos para:



·         em vez de falar sobre o lucro, falar sobre riqueza para as nossas cidades;
·         em vez de falar sobre redução de tributos, falar que queremos cidades competitivas;
·         em vez de priorizar quantos funcionários contratamos, priorizar quantas famílias dignificamos;
·         em vez de reclamar da mão de obra, nos unir aos meios acadêmicos e afins para construir profissionais melhores para nossas empresas.



Para uma família, “aquele que cuida do futuro de seus filhos não é seu inimigo”. Isto represa e isola a tentativa de demonização do cidadão empreendedor e abre as portas para construir sob o respaldo dos brasileiros uma nação livre e respeitada pelas demais nações.

O povo brasileiro necessita acreditar que seus valores são defendidos por quem lhes oferece dignidade e futuro, não dependência e passado.

Lembro-me da canção Vozes da Seca, do saudoso Luiz Gonzaga, que dizia:



“Seu doutô os nordestino têm muita gratidão
Pelo auxílio dos sulista nessa seca do sertão
Mas doutô uma esmola a um homem qui é são
Ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão
É por isso que pidimo proteção a vosmicê
Home pur nóis escuído para as rédias do pudê
Pois doutô dos vinte estado temos oito sem chovê
Veja bem, quase a metade do Brasil tá sem cumê
Dê serviço a nosso povo, encha os rio de barrage
Dê cumida a preço bom, não esqueça a açudage
Livre assim nóis da ismola, que no fim dessa estiage
Lhe pagamo inté os juru sem gastar nossa corage
Se o doutô fizer assim salva o povo do sertão
Quando um dia a chuva vim, que riqueza pra nação!
Nunca mais nóis pensa em seca, vai dá tudo nesse chão
Como vê nosso distino mercê tem nas vossa mãos.”

Em meio a essa tragédia, a esse tumulto, precisamos desenvolver um plano que produza uma saída que auxilie um grande contingente de cidadãos a vislumbrar melhores condições de vida, de trabalho, de negócios e de perspectivas e, nesse sentido, ofereço uma proposta.

Ela parte do princípio de que a formação inadequada de nossos jovens fez com que os modelos de negócios das indústrias nacionais migrassem do “pensar antes do fazer” (construir para o futuro) para o “fazer” (reproduzir o passado), o que condenou nossos negócios ao baixo valor agregado, fruto do necessário uso sistemático de mão de obra de baixa qualificação.

A atuação da China no mercado, valendo-se dessa mesma estratégia (a China detém 5,65% de toda a força de trabalho em atividade industrial no planeta, enquanto que o Brasil representa apenas 0,42% dessa força), inviabilizou nosso modelo de desenvolvimento, de sorte que precisamos construir um novo.

Antecipando-se à estagnação de seu modelo industrial, a China investe pesadamente em educação, almejando a substituição do logo “Made in China” pelo “Created in China”.

A visão marxista de nosso modelo educacional, focada na prática ao invés do conhecimento, impede-nos de perceber que nosso modelo educacional nos afasta de toda e qualquer possibilidade de participação no banquete dos justos, para o qual apenas serão convidados aqueles que puderem contribuir com novos modelos de desenvolvimento num planeta consumido por eras de desencontros entre a humanidade e a natureza. Os números invariavelmente mostram a nossa decadência intelectual e econômica perante as demais nações. Nosso nível de competitividade, que equivale à nossa capacidade de elaborar propostas estruturais de desenvolvimento dos povos, esvai-se como nossas perspectivas.

O conceito que mais, ou melhor, descreve nosso modelo educacional e de desenvolvimento é o da “transferência de tecnologia”, que abunda nos discursos oficiais como forma de mostrar o apreço que se tem pelo despreparo dos brasileiros no geral. Comentamos entre goles de cerveja gelada que nossas melhores cabeças vão para o exterior e, tendo nos acostumado a este fato, não procuramos sequer investigar as razões para esse escândalo.

Lemos ou ouvimos relatos sobre a absoluta irrelevância do Brasil no cenário internacional, quando nossos jovens são avaliados nos quesitos de conhecimentos básicos como ciência, matemática, língua pátria e raciocínio lógico, para minutos após nos concentrarmos em nossos problemas aparentemente insolúveis sem nos ater ao fato de que não são os filhos dos outros que foram mal preparados, mas os de nossos pais, e simplesmente estamos contribuindo para que isso continue a ocorrer com os nossos próprios filhos numa espiral decadente. Com isso, se o ambiente de negócios em que vivemos é ruim, imagine-se o ambiente em que nossos herdeiros viverão.

Ocorre que diversas entidades que atuam como instituições para nós sagradas ainda existem e podem fazer toda a diferença na construção de uma nova indústria, quiçá construída pela transformação das nossas. Existem as escolas de nível superior e existe o sistema S, no qual, entre outras, brilham o SESI e o SENAI. No caso das escolas de engenharia, a opção pelos cursos temáticos tem criado uma série de distorções na formação acadêmica de nossos jovens, uma vez que elas são instadas a construir profissionais especializados em tecnologias que logo serão sucedidas, de sorte que os formandos de seus cursos tornam-se escravos de sua formação e deixam de atender a nação brasileira naquilo que os empreendimentos mais hoje necessitam, que é o discernimento formado à custa de um amplo leque de conhecimentos gerais e fundamentado em cadeiras básicas como a língua pátria, a matemática e a ciência.

Essas escolas, em especial as escolas de engenharia, ainda hoje criam a figura dos pesquisadores, que são pessoas com aptidão para desenvolver novos conceitos; novas tecnologias; novos produtos; criando luz onde a grande maioria de nós apenas enxerga escuridão. Esses pesquisadores hoje são remunerados por bolsas, o que lhes retira a possibilidade de ter uma vida com o conforto compatível ao esforço que dedicaram para atingir o patamar de conhecimento que possuem e que força a grande maioria a sonhar em deixar nosso país em busca de melhores oportunidades de vida no exterior.

Dito isso, cabe aqui elencar a lista de propostas deste texto:

1º Promover para a regulamentação da profissão de pesquisador.

2º Trabalhar para permitir que departamentos de Ciência e Tecnologia (hoje simplesmente denominados Engenharia) possam ser formados em indústrias de médio porte para serem encabeçados por pesquisadores regulamentados e equiparados a um ICT.

3º Apoiar a elaboração de projetos de desenvolvimento de novos produtos e processos desenvolvidos por esses departamentos para apresentação a entidades oficiais como BNDES, FINEP ou FAPESP na busca por apoio financeiro à execução dos projetos.

4º Garantir que o desenvolvimento dos projetos seja feito pelo departamento interno de ciência e tecnologia da empresa que detiver a ideia inicial do projeto e que o aporte financeiro seja destinado à própria empresa.

5º Transformar os cursos de formação em engenharia e afins em bacharelados, através dos quais o futuro profissional terá formação latu sensu ou generalista.

6º Desenvolver parcerias entre as escolas de engenharia e o SENAI para oferta de cursos de especialização strictu sensu e de curta duração nas tecnologias utilizadas pelos empregadores. Com isso, se reduz o custo financeiro das escolas de engenharia e o profissional assim construído deixa de ser refém de sua formação. Dessa forma, a escola de engenharia desenvolve cursos latu sensu no nível estratégico e participa da formação strictu sensu no nível tático em parceria com o SENAI. Nesse sentido, o SENAI passa a participar da construção dos profissionais em escala nacional em conjunto com as demais escolas ao invés de competir com elas.

7º Transformar os cursos técnicos industriais em nível médio em latu sensu e utilizar o mesmo conceito dos cursos superiores, objetivando resgatar a média gerência dos processos industriais.

8º Oferecer, através das Diretorias Regionais dos Centros das Indústrias, cursos de preparação para a vida profissional para todas as demais carreiras, após avaliação vocacional dos jovens formandos indicados por mérito pelas escolas de nível médio e antes de terem se submetido a quaisquer processos seletivos. Avaliar seus desempenhos e disponibilizar seus currículos em bases de dados para avaliação por nossas indústrias quando demandarem profissionais dessas áreas.

Gosto de dizer que, para um pai de família, “aquele que cuida do futuro de seu filho não é seu inimigo”. Esse conceito represa e isola a tentativa de demonização do cidadão empreendedor e abre as portas para construir sob o respaldo dos brasileiros uma nação livre e respeitada pelas demais nações.

Sendo todos iguais, a justiça se valendo da venda para não distinguir uns dos outros já que não é cega, vítimas indistintas que somos das dificuldades naturais, partilhamos dos mesmos interesses, juramos a mesma bandeira, e assim não existe razão que embase a voracidade do poder público contra o cidadão, em particular aquele que empreende, que gera e mantém empregos que dão dignidade e razão de ser a inúmeras famílias de cidadãos brasileiros.

Esse não é o país de nossos pais e não desenvolvemos moral flexível para admiti-lo. É-nos inaceitável observar a inversão de valores que assistimos em nossos dias, nos quais admitimos não ter o governo do povo, mas, e isto sim, o povo do governo. É-nos inaceitável observar que a única razão para a existência do povo governado neste país é a de nutrir um estado que de faminto não consegue fugir à sua própria natureza, qual seja a de extorquir seus próprios cidadãos, sejam eles seus eleitores ou não. Não aceitamos que a liberdade plena seja fruto da supressão de todas as liberdades individuais, inclusive a de expressão e empreendedorismo, objetivo do estado utópico que tudo vê e a todos controla. Não aceitamos que a democracia seja obtida pela hegemonia política que elimina toda e qualquer semente de outro pensar.

O desenvolver desse projeto destrói na sociedade brasileira sua capacidade de empreender, sua capacidade de desenvolver e produzir produtos para seus compatriotas ou para os d’além-mar, e sua capacidade de consumir, exaurida que tem sido de seus bens, de sua dignidade.

Alheio às consequências, o Estado nos exige tributos como se vivesse em outra aldeia, como se fosse um invasor de outro planeta e que, por ter como objetivo a mera pilhagem, pouco se importa com o que se sucede em nossa realidade. Defrontamo-nos com uma situação em que dados oficiais constatam que o poder público consome próximo de 40% de tudo aquilo que a sociedade brasileira produz com seu suor, mas, por se considerarem acima do bem e do mal não entendem ser isto suficiente, e avançam destruindo nossas crenças e nossos valores para substituí-la por uma sociedade utópica, na qual a visão coletiva sobrepõe-se ao livre-arbítrio, maior dádiva de nosso Criador.

A taxa de juros que atrai o capital especulativo internacional é a mesma que pressiona a dívida pública. A especulação cambial que supostamente favorece setores que exportam é a mesma que pressiona os custos de toda a cadeia produtiva. O impacto da majoração dos preços administrados é razão para se pressionar toda a economia de forma a evitar que os índices de inflação reflitam decisões tomadas na contramão do bom senso. Como resultado, promove-se o endividamento do cidadão, forçando a redução de seu consumo, que minimiza a atividade industrial e põe em risco seu emprego. A economia estaciona, os investimentos diretos recuam, o endividamento cresce e o resultado, ora, o resultado…

Isso me faz lembrar a mágica orwelliana do duplipensar, na qual o decretar em 30 gramas o tamanho da ração semanal de chocolate foi explicado pelo grande irmão como fruto do sucesso no combate à fome, ignorando-se o fato de que na semana anterior a ração era de 50 gramas.

A nação brasileira merece mais respeito, nossas empresas também. Nossas famílias e a de nossos funcionários agradecem.