Pesquisadores relatam avanço das novas vacinas brasileiras - CIESP

Pesquisadores relatam avanço das novas vacinas brasileiras

Alex de Souza, Agência Indusnet Fiesp

As vacinas são os produtos mais eficazes no controle de doenças infecciosas. A varíola foi declarada erradicada oficialmente pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1979, graças a uma vacina que foi produzida há cerca de 200 anos. E, desde 1994, a poliomielite foi praticamente erradicada nas Américas, de acordo com Célio Lopes da Silva, doutor em bioquímica e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), que trabalha em pesquisa e desenvolvimento de vacinas desde 1990.

Ele foi o primeiro expositor a falar na reunião do Conselho Superior de Inovação e Competitividade (Conic) da Fiesp, realizada por videoconferência na quinta-feira (27/5), e conduzida pelo vice-presidente do Conic, Roberto Paranhos.

Naquela década de 1990, o grande desafio era desenvolver uma nova vacina para tuberculose com tecnologia revolucionária, e a solução foi o imunizante de DNA, ação pioneira que rendeu o primeiro trabalho na literatura sobre vacina de mRNA para tuberculose. “Foi a primeira vacina com a atividade preventiva e terapêutica descrita na literatura, que impede a reativação da infecção e pode ser usada em conjunto com a quimioterapia, indivíduos infectados com parasitas e HIV”, disse o pesquisador.

Um dos principais problemas apontados por Silva é o gargalo da pesquisa e desenvolvimento no Brasil, pois embora existam excelentes pesquisadores na área básica, com locais para realização de estudos clínicos, falta desenvolvimento tecnológico para transformar a pesquisa básica em produtos prontos, ao qual ele chama de “Vale da morte da ciência e tecnologia nacional”.

“Precisamos construir uma ponte entre academia e as empresas, para desenvolver as ideias e transformá-las em produtos para o mercado”, sugeriu, explicando que a entidade está trabalhando no desenvolvimento da Versamune, o que foi possível devido à criação da Farmacore. “Criamos infraestrutura para o desenvolvimento tecnológico, usando os recursos financeiros públicos e privados, com patentes, mas a empresa trabalha em pesquisa e desenvolvimento, não é produtora. Então, em algum momento teremos de transferir tecnologia para ter produtos inovadores e competitividade”, disse. O pedido para o início dos testes clínicos foi feito em março.

Por sua vez, o gerente do Núcleo de Inovação Tecnológica do Instituto Butantan, Cristiano Gonçalves Pereira, pós-doutor em Gestão da Inovação Tecnológica, disse que as conversas para o desenvolvimento da Butanvac começaram em abril do ano passado, mas que obviamente todo o processo é complexo, com imprevistos e ajustes durante o caminho. “Tivemos a inclusão de parceiros de um consórcio internacional, o que contribuiu imensamente no processo de desenvolvimento, e o estudo clínico no Brasil deve ocorrer no próximo mês. Trabalhando com um cenário otimista, poderemos ter aprovação emergencial para uso da vacina antes do final do ano”, adiantou Pereira, informando que a produção será 100% nacional.

Atualmente, o Butantan tem capacidade produtiva para desenvolver o imunizante, ou seja, a independência em relação à tecnologia, e possui também a plataforma tecnológica. “Tão logo seja possível, com as devidas aprovações, poderemos iniciar a produção em larga escala, e a expectativa é de começar com 18 milhões de doses”, afirmou.

Apesar da importância de se realizar parcerias e compor consórcios internacionais, Pereira reconheceu a necessidade urgente de fortalecimento da indústria nacional. “Ter a produção aqui já é um bom indicativo. Nossa fábrica acabou de conquistar uma certificação internacional da OMS [Organização Mundial da Saúde] e estamos nos preparando também para versões adaptadas da vacina, para combater as variantes que vêm surgindo”, explicou o especialista.

O pesquisador e professor Jorge Kalil, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), lembrou que fabricar uma vacina é simples, mas o difícil é descobrir como fazer e desenvolver, pois o vírus só desencadeia a doença quando existe uma mutação na interação com o homem, o que explica porque algumas pessoas têm contato com vírus e ficam doentes e outras, às vezes na mesma casa, não contraem a doença.

À frente da pesquisa para o desenvolvimento de uma vacina em forma de spray nasal, Kalil explicou que o grupo optou pelo estudo da resposta imune antes do desenvolvimento da vacina. “Estamos indo em sentido oposto, pois várias empresas fizeram uma aposta tecnológica e não procuraram cientificamente os melhores alvos da vacina”, avaliou.

A vacina nasal tem a vantagem de agir na mucosa e produzir resposta forte, segundo o pesquisador, que também disse ser muita mais fácil de ser feita, e 100% nacional. “As vacinas sendo desenvolvidas no Brasil são muito criativas. Precisamos ter mentalidade um pouco maior e investir mais em pesquisa e reduzir o gargalo mencionado anteriormente, na apresentação do Célio [Lopes da Silva]. Temos bons cientistas, mas infelizmente muitos vão para fora”, concluiu o cientista.

As vacinas que vem sendo desenvolvidas no Brasil são muito criativas, mas é preciso investir mais em pesquisa, segundo o professor Jorge Kalil. Foto: Everton Amaro/Fiesp