Calcular indenização é desafio na reparação de danos por cartéis
- Atualizado emAgência Indusnet Fiesp
Encontro com especialistas em direito concorrencial realizado em 4 de outubro na sede da Fiesp e do Ciesp teve como tema a reparação de danos causados por práticas de cartéis e sobre como isso repercute na vida empresarial, em função da Lei Antitruste.
“Uma empresa precisa da caracterização do ilícito feita pelo Cade, não que ele calcule a indenização”, o que não lhe cabe, disse no debate o superintendente-geral do órgão, Alexandre Cordeiro Macedo. “Ninguém sabe melhor o dano do que quem o sofreu.” Explicou que a reparação de danos no direito antitruste, da qual não cuida diretamente, faz parte do enforcement.
A respeito do Cade, lembrou que foi reforçado e que houve mudança na percepção social a seu respeito. Também a Lava Jato ajudou a entender os cartéis das construtoras. Mas, destacou, o que fazer no caso de cartéis? Quem se arrisca a entrar com ação de reparação de danos? Uma coisa que aconteceu foi o ganho de velocidade do Cade, que passou a encerrar casos em 3 anos.
Cordeiro fez a apresentação “Reparação de Danos Causados por Condutas Anticoncorrenciais”, na qual explicou o papel do Cade e a legislação. A Lei 12529/11, explicou, tem diversos artigos sobre reparação de danos. De seu artigo 37 destacou o valor da infração, nunca inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação. Há diferença, ressaltou, entre vantagem auferida e dano. Há efeito dissuasório e retributivo na punição, disse.
No artigo 45 se cuida da dosimetria, na citação ao grau de lesão ou perigo de lesão e aos efeitos econômicos negativos produzidos no mercado. Já o artigo 47 traz para dentro da lei a possibilidade de reparação de danos, pelo recebimento de indenização por perdas e danos sofridos. Há dispositivos relativos à confidencialidade de decisões do Cade.
O artigo 95 estabelece que a indenização se faz sem prejuízo das multas. Disse ser interessantíssima a discussão a respeito de TCC, acordos de leniência e ações por infrações à economia popular.
A resolução 21/2018 disciplina diversos artigos da 12.529. Começa dizendo que são públicos todos os processos. Uma exceção é o histórico da conduta; outra são as restrições listadas na 12.529. Há, ressaltou, tradeoff entre resultados no curto prazo no enforcement privado e fim no longo prazo do enforcement público e privado caso não se respeite a confidencialidade.
A resolução também fomenta a reparação dos danos concorrenciais.
A regra de ouro dos acordos de leniência é que o primeiro não pode ter condições piores que os outros, sob pena de acabar com o dispositivo – e daí acabar também com o enforcement privado.
“Se vocês querem a reparação de danos, protejam o sigilo da leniência. E protejam o sigilo dos Termos de Compromisso e Cessação [TCCs].”
Considera um sucesso o programa brasileiro de leniência, que segundo ele impressiona no exterior. Desde 2003 foram assinados 87 acordos, sendo 31 em 2017 (incluindo aditivos) devido à Lava Jato. E há 70 TCCs por ano.
Disse ser contra varas especializadas. “O que um juiz especializado vai fazer diferente do que o Cade fez?”, perguntou. Ou se confia no Cade ou não, disse. E há também discussões relativas ao mérito, porque cabe ao Executivo a formulação da política antitruste. O Judiciário não pode alterar o mérito de decisões, lembrou.
Importantíssimo no PLS 283/2016 o reforço à regra de ouro, com a instituição do single damage (quem não faz leniência nem TCC fica sujeito ao pagamento em dobro).
Não dá para o Brasil se isolar, afirmou. Temos que trabalhar com as melhores práticas das agências internacionais, disse a respeito da colaboração com outros países.
Ruy Coutinho, coordenador do Grupo de Estudos de Direito Concorrencial da Fiesp/Ciesp, destacou da apresentação de Cordeiro a explicação sobre a regra de ouro e o posicionamento a respeito de varas especializadas. Antes, ao abrir o evento, Ruy Coutinho listou como entraves à reparação de danos a lentidão do Judiciário, o custo das ações e a própria dificuldade de obter provas e quantificar perdas e danos para a dosimetria da decisão. Celso Campilongo, também coordenador do Grupo de Estudos, fez parte da contextualização.
Clareza e previsibilidade são aspectos importantes para coibir práticas anticompetitivas e também garantir segurança jurídica, daí a importância de debater questões como a confidencialidade dos documentos no Cade e sua linha divisória para que terceiros possam exercer o seu direito.
Quando as empresas recebem condenação no Cade por cartel, são penalizadas com multas que variam de 15% a 17% do faturamento obtido pela empresa (referente ao ano anterior ao da instauração do processo), que seguem para um fundo próprio. Mas há o outro lado: as empresas que foram prejudicadas pela prática do cartel; esses prejuízos privados não são calculados e ressarcidos atualmente.
O encontro teve como objetivo também elucidar como se estipulam os danos causados a terceiros, pois cada vez mais as empresas buscam reparação e há uma tendência do crescimento deste tipo de ação, no Judiciário, e a devida condenação.
Mauro Grinberg, sócio de Grinberg, Cordovil Advogados, também fez apresentação no evento, intitulada Prescrição na ação de danos concorrenciais. Segurança jurídica e o exercício do direito, ressaltou, fundamentam a prescrição (quem não o exerce perde).
O prazo prescricional se inicia a partir do fato considerado infração, lembrou, mas há nisso a complicação do tempo que o Cade leva para julgar os casos. Outra forma é a partir da ciência do dano. E no PLS 283 é citada a ciência inequívoca do ilícito, o que considera violação do princípio da segurança jurídica. A solução no PLS, que não agrada Grinberg, mas é ótima para a segurança jurídica, é a publicação do julgamento final do processo administrativo pelo Cade.
